Você provavelmente já ouviu falar na Medicina Baseada em Evidências. É uma prática bastante disseminada na área médica a de escolher tratamentos para determinadas doenças, com base em estudos que demonstrem evidências de resultados satisfatórios. O que poucos sabem, no entanto, é que existe também um movimento a favor da Psicologia Baseada em Evidências em saúde pública.
A Psicologia Baseada em Evidências - PBE (no original, Evidence-Based Practice in Psychology, ou EBPP) tem sido objeto de atenção há alguns anos da American Psychological Association (APA) – que organizou uma força-tarefa em 2005, com o intuito de reunir e divulgar práticas em Psicologia apoiadas em evidências científicas demonstradas na literatura, bem como de fomentar estudos que tragam subsídios para a atuação dos psicólogos e psicólogas. No Brasil, o primeiro livro sobre o assunto será lançado em agosto deste ano.
As práticas em psicologia são avaliadas principalmente de acordo com dois critérios em PBE: eficácia e utilidade clínica. A eficácia diz respeito à força das evidências de relações causais entre uma intervenção estudada e os resultados desta sobre um transtorno específico. A utilidade clínica, por sua vez, inclui aspectos como a possibilidade de generalização do tratamento estudado para contextos mais próximos ao setting natural, a viabilidade e a relação custo-benefício de uma intervenção.
Vários pontos devem ser levados em conta na escolha de uma prática baseada em evidências, citados pela APA:
- A perícia do psicólogo que irá conduzir o tratamento – que envolve uma análise bem fundamentada do caso e um planejamento claro do tratamento, habilidades interpessoais, auto-reflexão constante, busca de supervisão quando necessário, bom timing para decidir quando é o momento de usar determinada prática ou de modificá-la, atenção para os rumos do tratamento, dentre outros;
- As características do(s) paciente(s) – se referem a diferenças individuais, como: momento desenvolvimental pelo qual o sujeito está passando, grupo cultural a que pertence, contexto atual de vida (se está passando por estressores significativos, se há comorbidades, e até aspectos financeiros que possam ser impeditivos para determinados tratamentos mais caros, por exemplo).
A busca por evidências em práticas psicológicas pode ser feita lançando mão de diversos métodos de pesquisa. Observações clínicas (como estudos de caso sistemáticos), pesquisas qualitativas, delineamentos experimentais de caso único, pesquisas etnográficas, estudos longitudinais, estudos em contexto naturalístico, estudos com grupos, ensaios clínicos randomizados (randomized controlled trials na literatura, ou RCTs), meta-análises da literatura, dentre outros métodos são complementares para compreender da forma mais abrangente e acurada possível as práticas em psicologia.
Nas publicações científicas, podemos ter contato com vários estudos que possam subsidiar a escolha por um tratamento psicológico. A escolha pelo tratamento que tem mais evidências em favor de bons resultados, no entanto, muitas vezes gera controvérsias. Não se pode esquecer, por entanto, que um tratamento psicológico não pode ser considerado “pior”, ou “inútil” a priori. Basta que haja interesse em estudar e refletir criticamente sobre quaisquer práticas, para então reunir evidências a favor ou contra um determinado tratamento ou intervenção, e, sejam estas evidências a favor ou contra, buscar sempre pontos que possam ser melhorados para que novos estudos sejam feitos. Embora algumas abordagens já tenham demonstrado resultados de forma significativa (a cognitivo-comportamental é um bom exemplo disso, por se dedicar frequentemente à busca de evidências científicas), nada impede que outras abordagens sistematizem e demonstrem que suas práticas também funcionam.
A importância disso, mais do que contribuir para o desenvolvimento da ciência em Psicologia, é de contribuir para a sociedade como um todo. Em saúde pública, um planejamento deve levar em conta quais tratamentos irão ser mais eficientes, pois é interessante para todos que recursos financeiros e de tempo sejam aplicados da forma mais racional possível. Portanto, usar as evidências a favor não é apenas uma questão de posicionamento científico, mas de posicionamento ético.
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Referências*
Referências*
APA Presidential Task Force on Evidence Based Practice (2006). Evidence-Based Practice in Psychology. American Psychologist, vol. 61, nº 4, pp. 271-285.
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*Texto indicado pelo meu amigo Marcus, do CogPsi. Valeu, Marcus!
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